Espiral de Ilusão o samba do Criolo Doido
Criolo é um dos grandes nomes do rap nacional, parece estranho que o novo disco do rapper seja um álbum de samba, mas o samba sempre esteve presente no trampo do Criolo, em 2011 ouvimos “Linha de Frente” no disco Nó Na Orelha, e 2014 teve “Fermento Pra Massa" em Convoque seu Buda. Ainda há tempo, de 2006 trouxe “Voz e Violão”, que flertava com o samba de MPB. Agora em 2017 vem o “Espiral de Ilusão”, pela gravadora Oloko Records, sendo esse um disco dedicado ao samba e a sua quebrada o Grajaú.
A Capa do disco, é do designer gráfico e ilustrador Elifas Andreato, do Paraná, o mano já assinou trampos de Chico Buarque, na Ópera do Malandro, do Martinho da Vila, em A Rosa do Povo e do Paulinho da Viola em Nervos de Aço.
O álbum possui dez faixas, um disco curto, talvez pensado para o vinil, como os grandes clássicos do samba e MPB. O trabalho teve máximo cuidado tanto nas composições quanto nos arranjos, que tiveram participações de Daniel Ganjaman e de Marcelo Cabral.
“Lá Vem Você” abre o disco, que vem com o toque de cavaquinho trazendo a batida do samba, mostrando o cartão de visita do álbum:
“Virando a esquina, na porta do bar Sol de meio dia, no copo um capóte Pra pensar no almoço depois no jantar Sem café pra tomar Esperar o amanhã”
A próxima faixa é “Dilúvio de Solidão” traz sentimentos confessos, que fazem a cuíca roncar em um samba de morro:
“Chove dentro de mim Dilúvio de solidão Angústia que faz sofrer Não dei valor ao meu tesouro Quem só viu lata não sabe o que é ouro, mas chove”
A música “Menino Mimado” é uma bela composição, um samba composto e arranjado à moda da velha guarda e que traz a poesia de cunho social do Criolo:
A faixa quatro, “Nas Águas”, trás uma angústia sufocante pelo que passou e pelo novo que sempre vem:
“O ano não foi bom, por culpa minha ó pai Abençoa demais esse pobre infeliz Que o próximo vem assim de axé De amor pra ser feliz”
A próxima música é “Filha do Maneco”, um samba mais bem humorado, Criolo constrói personagens e um cenário fácil de se identificar:
“E já está fazendo hora extra O coveiro da cidade tá até bancando festa Mas se depender de mim Vou dar um papo reto no Maneco”
A faixa seis leva o nome do disco, “Espiral de Ilusão” o dedilhar no violão e o canto harmonioso aproximam a obra da MPB e a ilusão, é claro que só podia ser de amor:
“Abaixe o seu tom, não fale por mim Mulher tem fibra, não vai destruir Num espiral de ilusão você se meteu e lá me jogou Com você foi total desamor”
A canção sete é a “Calçada” que também trata de desilusões, porém a melodia não é baixo astral, e sim de um samba de roda com becking vocal:
“Eu sofri sem perdão Não consegui admitir a situação Logo o sofrimento se espaiô Eu fiquei mergulhado em desamor”
“Boca Fofa” é a faixa oito, um samba raiz, seguindo o rumo mais humorado do disco:
“É o Boca Fofa Boca Fofa quando é pega, não sabe falar Você pergunta a verdade, questiona, e só faz bafafa O Boca Fofa é recorrente de um adjetivo da questão Se faltei com a verdade, não sei falar com um irmão”
A faixa nove é “Hora da Decisão”, um chorinho para narrar o cotidiano da favela:
“Da brincadeira real De polícia e ladrão Sai da área, afasta a bola É hora da decisão”
Fechando o disco temos “Cria de Favela”, um samba misturado com ragga, mais acelerado que lembra dos meninos que trabalham nas biqueiras, numa forma do álbum conversa, diretamente, com a favela:
“Menino você não pode voltar Porque a biqueira não é seu lugar Quem vai lucrar com essa patifaria É gente da alta na papelaria Delação premiada jogo de poder E se for pra rua tentam me deter Mozinho tá longe Eu vivo a sofrer Me aposentar só depois de morrer Oh laraiê”
Criolo é um artista completo e versátil, o álbum Espiral de Ilusão tira o cara da sua zona de conforto, porém nem tanto, pois apesar de talentoso, Criolo é constantemente questionado pelo público do rap, seja pela sua lírica ou forma de compor e cantar, a verdade é que o público do rap está muito chato e só glorificam o hype da nova geração. Quem deve julgar o trabalho do Criolo não são os meninos mimados, mas sim, os agora, companheiros de gênero, os sambistas e moradores de morros e favelas, a qual o trabalho foi dedicado.