Usuário! Planet Hemp!
Em 1995, ano que, no Brasil, se inicia o governo tucano, o que mais tarde trouxe problemas a banda, ano do falecimento de Eazy-E , mas também foi o ano do avanço dos jogos eletrônicos e o surgimento do Slipknot.
Também foi em 1995 que o Planet Hemp entrou em estúdio para gravar seu primeiro disco Usuário, que foi produzido por Fabio Henriques e os próprios caras da banda, além de contar com Marcelo Lobato, d’O Rappa, que atuou como uma espécie de empresário, além de tocar teclados nas faixas "Não Compre, Plante!", "Dig Dig Dig (Hempa)" e "Skunk".
O álbum abre com a faixa “Não Compre Plante”, que foi feita em um ensaio em que o Baixista Formigão não compareceu, e então Rafael Crespo fez a linha de baixo, enquanto que D2 e BNegão improvisavam a letra. Essa música ficou proibida de ser vinculada, tendo como punição a prisão, caso os músicos a executassem por falar sobre plantio de maconha, tabu maior ainda do que falar sobre a legalização.
A letra decorre:
“Se você sobe no morro pra buscar e leva porrada
Se ligue, sangue-bom, tem alguma coisa errada
Não vem com 171, comigo não tem parada errada
O que tenho a lhe dizer eu falo cara a cara
Você já pensou que o problema pode ser você?
Falando sem se informar, você vai se fuder”
A próxima música é “Porcos Fardados” uma mistura clara de rap com rock e funk, ao estilo de Beastie Boys e DeFalla, inclusive com sampler’s das músicas “Funky Drummer” de James Brown e Gangsta Gangsta por N.W.A., e aborta a autoridade policial: “Porcos fardados acham que são reis”, canção da época de Skunk que diz assim:
“porcos da lei são todos marginais
matam pessoas inocentes econtinuam em paz
despreparados, incopetentes agem acima da razão
ao invés de impor a segurança apavoram a população
são ensinados a proteger uma minoria rica
da maioria pobre que paga com a vida”
A faixa três é o hino “Legalize Já” que foi trabalhada desde o início para ser o hit da banda, no início a banda achava a guitarra inicial de Rafael, para essa faixa, muito ruim, mas ao mesclar com a linha de baixo, acharam estranho e ao mesmo tempo bom, e assim ficou. Esse foi o primeiro videoclipe da banda, que foi proibido de ser exibido, mas a MTV Brasil comprou a briga e pediu na justiça liberação, que foi concedida, desde que a emissora vinculasse o clip somente após as 23:00, muitas pessoas aguardavam até as onze da noite para verem o clipe proibido, e se decepcionavam, pois não tinha nada de mais, a não ser censura e talvez o medo das verdades que são ditas:
“O álcool mata bancado pelo código penal
Onde quem fuma maconha é que é o marginal
E por que não legalizar? E por que não legalizar?
Estão ganhando dinheiro e vendo o povo se matar
Tendo que viver escondido no submundo
Tratado como pilantra, safado, vagabundo
Por fumar uma erva fumada em todo mundo
É mais que seguro proibir que é um absurdo
Aí provoca um tráfico que te mata em um segundo”
A faixa “deisdazseis” conta com o vocal do Gustavo Black Alien, que no momento não fazia parte da banda, mas pertencia ao que se chamava “Hemp Family”, onde os anônimos da época se juntavam e trocavam ideias, e todos disparando para o sucesso, era o caso do Planet Hemp, O Rappa, Raimundos, Chico Science & Nação Zumbi e Speed Freaks.
Esse último é o nome da dupla formada por Black Alien e Speed em 1991, Claudio Márcio, o Speed ouviu uma música que Bulletproof (que significa a prova de balas) gravou junto com DJ Rodriguez, ele gostou e intimou-o a cantar, assim nasceu a banda Speed Freaks (nome retirado de um filme de skate da Santa Cruz, já que Gustavo, o então Bulletproof era skatista amador), o grupo era formado por Speed, Gustavo e DJ Rrodriguez.
O nome Speed Freaks é uma gíria gringa que quer dizer “viciado em anfetamina”, Gustavo acha ostensão de mais chegar nas quebradas com o apelido de a prova de balas, as pessoas queriam colocar em prova mesmo, então achou por bem mudar, e o nome escolhido foi Black Alien, por se sentir como um alienígena: sendo negro e de classe média, era isolado na favela por causa da sua classe social, e no colégio, era o único negro, e assim isolado pelos branquinhos.
Speed se apresentou ao companheiro dessa forma: “E eu sou o Speed, eu sou foda, eu toco muito [contra]baixo, eu toco baixo há dez anos, eu sou músico e eu quero você na minha banda. A banda vai se chamar Speed Freaks”.
Como parte da Hemp Family, e grande amizade com os músicos do Planet Hemp, o Speed Freaks participou da gravação do CD Usuário, primeiro na faixa “deisdazseis” com voz de Black Alien e depois nas faixas “Skunk” e “ Speed Funk” duas músicas instrumentais que teve baixo tocado por Speed.
“Ele bate no bumbo e você sente no peito Esse é o Planet Hemp, fazendo efeito Toda porrada que entra no ouvido sai da guitarra Rap-rock'n'roll-psicodelia-hardcore-e-ragga Baixo, lendário Nemo, bebendo cana O grito vem da rua, movido a marijuana Deixa eu fazer de fazer Deixa eu fazer de falar a verdade É que eu me sinto bem, só com os sangue bom aqui da cidade Sou Black Alien, sangue bom Do Rio de Janeiro Terra do samba, do reggae, do rap, do rock, do ragga e do pandeiro Eu canto o que eu falo, Eu falo o que eu quero, Qual é o problema? Me contem, me contem, me contem, me contem Eu canto o que eu falo, Eu falo o que eu quero, Qual é o problema? Me contem, me contem, me contem, me contem Paz, pa-pa-Paz, Planet Hemp Paz, pa-pa-Paz, the Funk Fuckers Paz, pa-pa-Paz, O Rappa Paz, pa-pa-Paz, Black Alien”
Letra da música “Deisdazseis” que trás um pouco do espirito da Hemp Family.
A número 5 é “Phunky Buddha”, uma expressão para maconha, uma porrada sonora que se desacelera para dar espaço ao discurso:
“Sinta os efeitos que fazem a minha cabeça
Fumar um baseado e tomar uma cerveja
Eu sou fora da lei por fumar uma erva
Mas ninguém nunca me perguntou se isso me interessa
Velhos impõe leis antes mesmo d'eu nascer
E será que eu sou obrigado a obedecer
Falam sem se informar que ela faz mal
Mas está mais que provado que o efeito é natural
Este é o Planet Hemp tentando te alertar
Que uma erva natural não pode te prejudicar”
Próxima música é “Maryjane” traz uma pega mais de skate, outra bandeira do grupo, num punk rock in english com o sample “Durango 95” dos Ramones:
“Look at me and see my red eyes
I'm muthafucking crazy in fulleffect in, your ass
Throw your guns and feel the pain
Planet Hemp, I love you, Mary Jane, Mary Jane, Mary Jane, Mary Jane”
Tem também a faixa instrumental “Planet Hemp” com o ruído ensurdecedor de um helicóptero e do outro lado o baixo pesado enquanto a banda grita o nome da banda!
Faixa 8 é “Fazendo sua Cabeça”, numa canção mais suingada ao som do funk e soul, onde B.Negão e D2 mandam a letra:
“Fazendo a sua cabeça com a cultura do arrastão
pra você poder sobreviver, cê tem queter boa educação.
Boa educação que eu to falando não são boas maneiras,
é saber distinguir, o pó da poeira.
Porque malandro quando tá na pior sabe sair de lá,
de lá o único barulho que eu escuto é rá-tátá rá-tatá.”
“Futuro do Pais” é o próximo som, que começa num samba com toda a malandragem do D2, mas logo o baixo chega soando como um simples fundo, vai se incorporando até roubar a cena de vez, e logo a música vira um trash metal:
“De dia à procura de comida
a noite um lugar pra dormir
carrega no corpo feridas e ainda consegue sorrir
dizem que o nosso país não vai mal
porque o povo ainda faz carnaval
mas os pequenos e mal amados não compartilham da mesma visão
há tristeza no seu coração
vivem a margem do nosso país
assaltando e ferindo quem passa
tentam gritar do seu jeito infeliz
que o país os deixou na desgraça”
Faixa 10 e “Mantenha o Respeito”, num ragga rock, com pesada linha de baixo e memoráveis riffs, a bronca é:
“D2 e preste atenção
Portas se abrem e aumentam o poder da visão
Isso é o meu compromisso
E se eu fumo ninguém tem nada com isso
Não, não preciso da sua postura
A minha segurança eu faço na cintura
Um hipócrita vai e os valores não caem
É tanto preconceito que eu não aguento mais
Se você tem amor pelo que tem no peito
D2 mas mantenha o respeito”
A estreia do Planet não é nada romântica, não teve nenhuma faixa mais “fofa” que outras bandas de rock dos anos 90 se preocuparam em trazer em seus discos, e a faixa “Puta Disfarçada” veio pra lembrar isso, numa pegada mais esculachada estilo B.Negão em sua fase The Fuck Fuckers:
“Ei menina o que você tem na cabeça
Só quer se maquiar e usar roupas de etiqueta
Parece uma boneca toda fantasiada
Mas quando olho por dentro eu não vejo nada
Você só pensa besteira e fala coisas banais
Conversar com você não me traz nada demais
Mas eu já disse que te odeio e senão disse,
Puta veja como estou enrugue os olhos
E seque suas lágrimas eu não quero ver você chorando assim
Você é uma puta disfarçada e não serve pra mim”
A faixa 12 é um funk com baixo de Speed, denominada “Speed Funk”, trata-se de um instrumental da Hemp Family”, assim como a track seguinte, que tem a musicalidade do Speed que também é uma raridade cantada por Skunk e refrão de D2 e BNegão "Mutha Fuckin' Racists":
“Yeah, sucker, I'm black like dat, ha
And I don't give a fuck if you're a fuckin' white fagg
My freaky flow will let your ass know
Dat you're not my fuckin' brother not my fuckin' bro
Try, t-t-try, try, for you it's time to die
Not goin' out like dat so you gotta make my day tonight
We got love for whom deserves
But da hate in your heart will make you burn in da next curve.”
A música 14 do álbum é um ragga com o marcante refrão “Dig Dig Dig (Hempa)” que leva o nome da faixa, e retoma o assunto, na voz de D2:
“Acenda um e ouça o que eu tenho a lhe dizer
Esse é o Planet Hemp e não tenho o que esconder
Fumo maconha sim, mas calma meu camarada
Eles um dia vão ver que a lei estava errada”
E ainda na voz de B.Negão:
“Acenda um e ouça o que eu tenho a lhe dizer
Esse é o Planet Hemp e não tenho o que esconder
Fumo maconha sim, mas calma meu camarada
Eles um dia vão ver que a lei estava errada”
“Skunk” é uma faixa em homenagem ao mano que se foi, a faixa é um instrumental, mas no finzinho podemos ouvir:
“Caralho mermão, esse bagulho é muito bom Porra, vale umas 30g porra Muita maconha maluco, um baseado atrás do outro cara.”
Faixa 16 é “A Culpa é de Quem?”, que é funk bem pesado, com letra forte que dá um tapa na cara da hipocrisia:
“Trabalho oito horas, sete dias por semana
Só por fumar uma erva, eu vou entrar em cana?
Deputados cheiram bebem e não vão para prisão
Por que é ilegal?
Eles que lesam a pátria e sou eu o marginal
Não, não seja alienado, eles falam que faz mal
E você aceita calado? Procure se informar
Uma erva natural não pode te prejudicar
Quem de nós está errado?
Você consome essas merdas e eu fumo um baseado
No que você pensa então?
Eles pegam a palmatória e você estende a mão”
O disco fecha com a música “Bala Perdida” que contém uma música “secreta” dentro dela, isso mesmo, o disco tem uma faixa oculta instrumental lá no finzinho, nos últimos 1 minuto e 26 segundos, mas a última canção. Voltando a “Bala Perdida”, a música é uma pedrada, num hardcore alucinante:
“Você anda pelas ruas com medo de que ?
São apenas as balas perdidas querendo encontrar você
para combater o tráfico é muito fácil é só matar
vão matando o favelado e nem pensam em legalizar
é revolta na favela que tá cansada de apanhar
assim como a polícia estão querendo se arrumar
lampião que tava certo são macacos do governo
ou te fazem emboscada ou te causam desespero.”
E assim fecha um dos discos mais épicos do rock brasileiro e da cena underground e da bandeira da legalização da maconha!